Resenha – Tiros não chegam ao céu

Tiros não chegam ao céu.

O livro

Após “Como Samba-canção”, Adriana Tourinho vem com o seu segundo romance, que tem tudo para superar o sucesso do primeiro. “Tiros não chegam ao céu”, lançado em 2023 pela Editora Transversal da Flávia Iriarte e da Andressa Tabaczinski, amplamente conhecidas pela plataforma do “Carreira Literária”, conta com uma produção de impecável. Também fazem parte do time de produção: Olivia Lober, responsável pela excelente revisão e Bianca Battesini, membro da produção editorial, responsável pela arte da capa. O texto de contracapa é da escritora e editora Julia Dantas.

A história

As 175 páginas já começam com a invasão do Forte de Copacabana, em 1º de abril de 1964, atingindo o leitor com cargas de ação e criando a promessa de um enredo forte e consistente, ambientado em plena revolução.

Assim, Adriana vai construindo a história do Sargento Heitor Reis, que tem a meta de ser piloto da aviação comercial e que encara o exército apenas como uma fonte de recursos para a sua manutenção — um trabalho fácil, onde não precisa tomar decisões — até conseguir concretizar o seu sonho.

Então a autora vai construindo o clima de tensão pré-revolução de 64 em torno do cotidiano do Sargento Reis. Decidido a não se informar e muito menos se envolver com a movimentação política da época, Reis não se posiciona a favor ou contra os anseios revolucionários prestes a eclodir. Porém, não escolher um lado tem os seus riscos.  E o desenrolar dos fatos levam a sua vida a mudar de uma hora para outra.

As camadas do texto

Embora eu tenha nascido em 1964, a preocupação maior do meu pai sempre foi levar para casa o sustento da família. Da mesma forma, Adriana Tourinho mostra que a vida das pessoas comuns, não envolvidas com grupos e manifestações políticas, praticamente não muda. Porém, os envolvidos, assim como as suas famílias, pagaram altos preços com perseguição, prisão, torturas e até morte.

Nunca esqueço do que dizia um professor de Antropologia, durante o meu curso de Jornalismo: “Felizes são os alienados, que vivem sem preocupações externas; vivem como se fossem eternos, sem pensar na morte ou nos problemas que afligem o país e o mundo. Quem é mais consciente e mais bem informado sofre muito mais.” Ou seja, todos pagamos um preço por nossas opiniões e posicionamentos. E se deixarmos que o medo cale a nossa voz e reprima os nossos atos, jamais construiremos um mundo melhor para se viver.

Por isso, Reis se transforma e age, não por impulso ou apenas por pura amizade. Ele passa a tomar as decisões que julga corretas, norteado pela sua consciência de ser humano, de brasileiro, de amizade e de família. Assim, injustiças e a violência que ele vivencia são os gatilhos que vão promover essa gradativa transformação. A partir do momento que ele sacrifica seus antigos ideais em detrimento dessa consciência recém-despertada, ele aprende a deixar de se ver como centro do universo e muda os seus valores.

Quote e escrita

“… ela ofereceu os lábios, nem bem tocaram o chão.”

A evolução da escrita da Adriana Tourinho é nítida e admirável. Se o seu primeiro livro conseguiu me conquistar, “Tiros não chegam ao céu” traz uma linguagem bem trabalhada. Portanto, o resultado de muita pesquisa em jornais da época como historiadora, alinhado ao trabalho de escritora, é perfeito: traz a dosagem certa de fatos e ficção, de narrativa e prosa poética.

A autora

Adriana Tourinho tem orgulho de ser carioca e mantém essa conectividade do Rio de Janeiro com seus textos. Fez mestrado em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e fundou em 2016 a empresa Lusofonia @lusofonia, que difunde tanto a cultura brasileira quanto a língua portuguesa para estrangeiros. Também figura em diversas coletâneas de contos, incluindo o texto “O trabalho”, publicado no Brasil e no exterior. Já escalou o Pão de Açúcar, é portelense e adora sorvete de milho-verde.

Resumindo, recomento demais essa leitura.

Leia na Amazon “Tiros não chegam ao céu” clicando aqui