- Gênero: Domínio Público | Público Infantil
Lenda indígena
Contam os ribeirinhos que, na floresta amazônica, Boiúna se engraçou de uma índia e a emprenhou.
Às margens do rio, contorcendo-se em dor, a indígena conseguiu dar à luz a um casal de gêmeos.
Porém, o que ninguém esperava, é que os recém-nascidos não nasceram gente, e sim, duas grandes serpentes. O macho, a índia chamou Honorato, e à fêmea, deu o nome de Maria. Mas por que não lhe deu nomes indígenas? Porque ela havia ouvido os nomes das bocas dos católicos e acabou se agradando deles.
Como serpentes, as crias logo seguiram para viver no fundo do rio.
Com o tempo, o povo foi vendo que uma serpente era boa, porque salvava as pessoas de afogamento e espantava as piranhas. Então, passaram a chamar o animal de Cobra Norato. Porém, a irmã dele era uma serpente má: traiçoeira, fazia de tudo para afundar as embarcações e matar quem caísse nas águas. Dessa forma, passaram a chamar a serpente má de Maria Caninana.
A índia conservava o amor de mãe em seu coração, que ressoava apenas no Cobra Norato. Assim, esse amor atraía, em todas as noites de lua, a serpente macho para a margem do rio. Em terra, ela se despia do couro de cobra e se transformava num belo rapaz. Só assim o filho podia passar as noites com a mãe.
Por outro lado, Maria Caninana era tão má, que jamais sequer pensou na mãe.
Um dia, as duas serpentes irmãs travaram um intensa luta sob as águas do rio e o Cobra Norato matou Maria Caninana.
Durante algumas noites que Honorato abandonava a sua couraça de cobra e virava homem, ele ia a festas para se divertir, fazia amizade com outros jovens e dava atenção aos idosos do povoado.
Mas o seu destino cruel o forçava toda vez, antes do último cantar do galo, a voltar para dentro do corpo da cobra e retornar ao rio.
Durante suas passagens como homem, conseguia convencer um ou outro amigo a ajudá-lo a pôr fim naquela triste maldição. Era só alguém ir à beira do rio quando o Cobra Norato estivesse dormindo, sacudir dentro da sua boca 3 gotas de leite materno e danar um ferro virgem na cabeça da serpente estirada na areia. Então, quando a cobra soltasse pelo menos 3 gotas de sangue, a cobra viraria homem para sempre.
Vários amigos, e até a própria mãe, tentaram a manobra para quebrar o encanto.
Mas, quando chegavam perto da enorme serpente e viam seus dentes afiados, brilhando ao luar, e recuavam de tanto medo.
Então, eis que um dia, um soldado apareceu pelas redondezas e Honorato fez amizade com o moço. Conseguindo convencê-lo a lhe ajudar, o bravo soldado cumpriu finalmente o ritual e Honorato ficou homem para sempre.
Honorato ajudou o soldado a queimar o couro da cobra e as cinzas se espalharam, levando a sua história para toda a região.
Observação do Autor
Essa lenda da serpente encantada inspirou um dos episódios da série da Netflix, Cidade Invisível, baseada em lendas do folclore nacional. "Cobra Norato" também é o nome de uma famosa e importante obra literária de Raul Bopp, drama épico mitológico.