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Machado de Assis além da morte: três obras psicografadas | Epicentro Literário
Rosângela Martins

Machado de Assis além da morte: três obras psicografadas

    Redescobrindo Machado de Assis

    Durante meus estudos sobre escrita criativa, redescobri a genialidade dos textos machadianos. Contos repletos de ironia e sagacidade, demonstrando o pleno domínio da língua e da natureza humana. Após décadas de contato superficial, essas qualidades — que tanto bateram à minha porta e eu as via, mas não as enxergava — enfim, aclararam-se na minha mente e me fisgaram de jeito.

    Assim, a saudade e a curiosidade passaram, então, a nortear o direcionamento da minha atenção.

    Dessa forma, as recorrentes leituras e as pesquisas me levaram à descoberta de outras obras, inusitadas, dignas de atenção.

    Obras pelo Espírito do grande mestre

    Após 116 anos do seu desencarne, eis que descubro Machado de Assis ressurgido, assinando três obras psicografadas.

    Na condição de espírita, não ponho em questão a veracidade da psicografia, mais do que comprovada, desde as pesquisas de Allan Kardec até as ações de conceituados médiuns como Chico Xavier, Divaldo Franco e tantos outros. Por isso, as obras atribuídas ao espírito Machado de Assis exigiam a minha atenção. Além de possuírem o endosso de instituições espíritas, provindas de médiuns atuantes e com trabalho fraterno inquestionável, quem teria autoridade suficiente para questioná-las quanto à sua proveniência ou autenticidade? Mesmo sem possuir o olhar de um perito, eu precisava encontrar a coerência e a presença do grande escritor nos três textos psicografados por três médiuns diferentes em três períodos diferentes.

    Machado de Assis além da morte: três obras psicografadas do gênio da literatura

    • Memórias Póstumas de Machado de Assis, publicada em 2008 pela União Espírita Mineira, mas recebida em psicografia pela médium Ismênia dos Santos em 1958;
    • Duda, romance cuja primeira edição foi publicada em dezembro de 1987, recebida por meio de psicografia pela médium Marilusa Moreira Vasconcelos, em 1986; e
    • Redenção, relato publicado em 2016 pelo Centro Espírita União, Amor e Luz, em Salvador, recebido em psicografia pelo médium Augusto Riccio no decorrer de 8 anos, provavelmente entre 2008 e 2015.

    Se existem outras obras atribuídas ao espírito Machado de Assis, ainda não as encontrei, até a presente data.

    (Em futuros artigos você encontrará a resenha de cada um dos livros citados acima.)

    O objetivo de trazer aqui as três obras em questão não é investigar se realmente foram ditadas pelo espírito Machado de Assis. Deixo essa tarefa aos médiuns, técnicos ou peritos com tal capacidade. Porém, abro caminho através do meu olhar crítico para que os leitores possam refletir e se aprofundar, fazendo suas próprias leituras de cada obra.

    Identificando uma comunicação mediúnica

    Segundo Allan Kardec no livro dos Médiuns, existem algumas maneiras de identificar se uma comunicação é proveniente de um espírito superior ou não. Por isso, os médiuns precisam estudar e frequentar uma casa espírita:

    A linguagem – A linguagem dos espíritos verdadeiramente bons e superiores é sempre digna, nobre, lógica, isenta de contradições; respira a sabedoria, a benevolência, a modéstia e a moral mais pura.

    O bom-senso – Não há outro critério para discernir o valor dos espíritos senão o bom-senso.

    Os conselhos – Conhecemos os espíritos pelos seus conselhos, ou seja, pelos sentimentos que inspiram e os conselhos que dão, sempre para o bem.

    Se observarmos as três obras em questão, de forma isolada, podemos encontrar correspondências com a doutrina espírita e características da escrita machadiana, conforme abordaremos em outra oportunidade. Porém, se as analisarmos de forma conjunta, veremos uma contradição no que diz respeito ao relato de Machado de Assis sobre os fatos que se sucederam logo após o seu desencarne. Entretanto, como o objetivo não é identificar a veracidade da psicografia, analisarei a coerência do conteúdo de cada obra, individualmente.

    A mensagem que esclarece

    “Oferecendo esse esforço modesto ao amigo leitor, julgo prudente endereçar-lhe uma explicação, quanto à gênese destas páginas.

    Dentro delas, sou o primeiro a reconhecer que os meus temas não são os mesmos. Os que se preocupam com a expressão fenomênica da forma não encontrarão, talvez, o mesmo estilo. Em período algum, faço referências de sabor mitológico. E naqueles velhos amigos que, como eu próprio aí no mundo, não conseguem atinar com as realidades da sobrevivência, surpreendo, por antecipação, as considerações mais estranhas. Alguns perguntarão, com certeza, se fui promovido a ministro evangélico.

    Semelhante administração pode ser natural, mas não será muito justa. O gosto literário sempre refletiu as condições da vida do Espírito. Não precisamos muitos exemplos para justificar a afirmação. Minha própria atividade literária, na Terra, divide-se em duas fases essencialmente distintas.”

    (…)

    “Meu problema atual não é o de escrever para agradar, mas o de escrever com proveito.

    Sei quão singelo é o esforço presente; entretanto, desejo que ele reflita o meu testemunho de admiração por todos os que trabalham pelo Evangelho no Brasil.” (Do livro “A Boa Nova”, por Humberto de Campos, 09/11/1940, psicografado por Chico Xavier)

    A mensagem acima bem poderia ser um dos escritos do espírito Machado de Assis ou de quaisquer outros espíritos de escritores renomados. Afinal, é natural que todos, o que inclui os escritores, após a experiência do desencarne e pelos conhecimentos adquiridos no mundo espiritual, modifiquem suas concepções. Com a evolução pelo aprendizado ao final de uma existência e no mundo espiritual, é natural que a nova fase e os novos valores se reflitam nas temáticas e até e no vocabulário agora assumidos. O importante, como disse Humberto de Campos, é escrever com proveito: mensagens que esclarecem, edificam, alertam e consolam.

    Comparando duas das três obras

    A primeira obra de Machado de Assis recebida do plano espiritual se deu em 1958, “Obras póstumas de Machado de Assis”, pela médium Ismênia dos Santos, mas só publicada 50 anos depois, em 2008.

    O ano de 2008 também marcou o cinquentenário do desencarne de Machado de Assis e foi o início das mensagens do espírito Machado ao médium Augusto Riccio. Em 2016, esse médium baiano publicou no livro “Redenção” o resultado desses 8 anos de mensagens.

    Embora a temática principal dos dois livros seja a mesma: o desencarne e os primeiros momentos fora do corpo físico e as primeiras missões no além, as obras mostram versões diferentes.

    Em “Memórias Póstumas”, o espírito Machado de Assis deixa o corpo logo após o falecimento e permanece próximo a ele durante o velório, até o sepultamento, retornando para a sua casa, ainda incrédulo da própria morte. Como foi uma obra transmitida após 50 anos do desencarne do escritor, que se deu em 1908, talvez por isso, assemelha-se mais à forma de escrita do grande autor, quando em vida. O livro mostra a visão de um encarnado que está em adaptação à sua nova condição.

    Já a mensagem de “Redenção”, que veio após 100 anos de estadia no mundo espiritual, reflete uma mudança ampla da percepção do autor, agora consciente de sua situação e plenamente integrado em sua missão. Nesse momento, vemos um Machado de Assis munido de uma linguagem mais adaptada à sua realidade e adequada à missão conferida. No início de “Redenção”, ele também começa com o relato pós-morte. Porém, o faz de dentro do seu caixão, de onde é levado para o mundo espiritual, após intensas reflexões e sofrimentos em sua clausura.

    Embora os fatos narrados divirjam, em parte, nas duas narrativas, encontramos justificativas para tal ocorrência.

    As duas obras foram escritas com 50 anos de intervalo uma da outra, é certo que nesse período, Machado de Assis passou a contar com uma nova percepção, do ponto de vista espiritual, bem mais evoluída e focada em sua nova missão.

    Então, a julgar pelo conteúdo e coerência, poderíamos até ler a narrativa pela psicografia da médium Ismênia dos Santos como uma continuidade ao livro de Lúcia Miguel Pereira(Machado de Assis, Estudo crítico e biográfico – 1936). Afinal, a apresentação de relatos corroboram com fatos e personagens destacados na obra da escritora e crítica literária.

    Escrita e estilo de Machado de Assis

    Em vida, Machado de Assis se fez conhecer por obras marcadas pela objetividade, ironia e crítica social. Ele também escreveu obras românticas, que apresentam idealizações, questionamentos sobre a vida, e discutem a ascensão social. Machado de Assis é o autor da desconfiança, seu narrador suspeita de tudo e de todos, e sabe que nada é o que parece ser e que há sempre outra verdade por trás das aparências, marcada pelo olhar irônico sobre a realidade do país e sobre a natureza do ser humano.

    Conforme observei, parte do estilo de quando em vida continua em seus textos: capítulos curtos, a quebra da quarta parede — ao se dirigir diretamente ao leitor —, metalinguagem e ironia, agora um pouco mais moderada, tendendo mais para o humor do que para o deboche. Se por um lado, quando encarnado, amou os mistérios e tentou decifrá-los, porém, através do seu pragmatismo e da sua lógica, sem se dobrar às explicações fornecidas por crenças religiosas, agora, suas aspirações são outras.

    O novo Machado de Assis

    Se em Dom Casmurro Machado constrói um narrador não confiável para plantar a dúvida no leitor, agora em suas próprias memórias, ele busca a credulidade desse leitor. Assim, com esta obra mediúnica ele quer comprovar junto aos encarnados a imortalidade do espírito. Por isso, ele narra, de forma lenta e reflexiva, a experiência da sua própria desencarnação.

    Assim, nas obras “Memórias póstumas de Machado de Assis” e “Redenção”, o autor volta a ser o narrador defunto. Porém, sem a ironia cruel de Brás Cubas. Afinal, trata-se do relato verdadeiro da própria experiência de passagem para o outro lado.

    Adaptando-se ao além, sua escrita mostra-se revestida de certezas e de sobriedade, abordando assuntos que não merecem pouco caso. Após uma existência cética e agnóstica, ele se rende e confessa o seu equívoco quanto ao espiritismo. Agora, a ansiedade o toma porque deseja se fazer compreender, tenta redimir-se com suas mensagens de alerta e de esclarecimento sobre a continuidade da vida após a morte física.

    Baseado em fatos, que sempre foram seus ponteiros da verdade, do plano espiritual, a sua missão está além de simplesmente convencer os leitores de que a morte não existe e que o espírito é eterno. Ele sabe que sem a crença na imortalidade, a passagem do homem na Terra não teria o menor sentido.

    Portanto, pelo ponto de vista do espiritismo, os relatos machadianos pós-morte fazem todo o sentido.

    Considerações Finais

    Em O Livro dos Espíritos, Allan Kardec esclareceu que os espíritos não estão à nossa disposição, sujeitos à nossa vontade. São eles que escolhem para quem desejam se manifestar.

    A literatura espírita oferece à humanidade amplo conteúdo de elevação moral, científica e filosófica, baseadas no Evangelho. Ao mesmo tempo, traz explicações racionais que ampliam o entendimento e incentivam a reforma íntima e a prática da caridade para o progresso individual. São ensinamentos que colaboram para a transformação dos homens e, consequentemente, para a construção de um mundo melhor.

    Não importa a época, grandes escritores, como Machado de Assis, nunca sairão de moda, porque a cada leitura, encontramos um detalhe relevante. Pois, temos muito a aprender com eles.

    Finalizando, entendemos a importância da prática da leitura para aprendizado e desenvolvimento do raciocínio, como um ótimo exercício para a mente e para a formação do caráter. A leitura também leva a mudanças de pensamentos, de concepções e de comportamentos, auxiliando no percurso da existência e na busca de um propósito maior, independentemente de crença ou de religião. Afinal, como dizia Monteiro Lobato: “Um país se constrói com homens e livros.”

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