Relógio de bolso
Da janela, a esmo, seu olhar averiguava, a terra rochosa em que chuva não penetrava.
Confirmava as horas em seu relógio de bolso, herança de família, o último bem valioso.
A vizinhança toda achava loucura, vender a vaca magra e matar a única cabra. Podendo
penhorar, esta velhacaria que insistia em guardar.
Costumavam lhe dizer: “Nem que seja italiano do século passado, venda-o para mais
alguns dias viverem.”
É certo que as recordações não matam a fome, mas enobrece o homem.
Apertava-lhe nas mãos o relógio em quantia idêntica ao aperto do coração.
Na despensa vazia nem farinha havia. Apenas um restante de água na moringa. Nem
restos pra contar história desta seca rigorosa.
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